Último
segunda-feira, 16 de abril de 2012
Não vou pensar em sinais. Gosto de procurar sinais nas coisas porque sei que eles não me dizem nada, mas eu gosto de acreditar que eles dizem alguma coisa. Nos últimos tempos tudo tem se resumido em sinais que eu não soube ler. Nunca vamos saber todo o alfabeto da vida que tem mais caracteres que o chinês, e isso nos frustra. Mas bem! Voltei pra cá. Tenho praticado a escrita e vou publicar coisas aqui. Também vou retrabalhar os únicos dois textos daqui que merecem isso o "Vazio" e o "Arrepios". Serão revisados e o "Vazio" vai ser, talvez, encaixado com outros contículos num só. Respeitando-se os limites claro.
Esses dias eu ouvi alguém, a Kyky, falar sobre você escrever cartas para você mesmo no futuro. Achei bastante bonito, poético e, o que muitos achariam, infantil. Não sou tão seguro de mim mesmo pra crer que escrever mensagens para você ler daqui a cinco, dez anos, é infantil. Mas também não posso negar que pensei isso quando ouvi. Tempos passaram e eu resolvi reler alguns textos daqui. Eu gosto daqui. É como voltar pra casa depois de uma longa estada no exterior. É muito bom rever as coisas todas no seu lugar, meus bonequinhos de brinquedo todos de pé na estante, meus livros com suas lombadas sérias demais pra uma criança, os ossos de bichos mortos que eu recolhi, a janela com aquele sol acalentador, eterno, esquentando a casa de madeira.
Descobri que gostei da experiência, ainda que acidental. Reli coisas antigas e percebi que estou diferente. Também me disseram, no mesmo contexto, inclusive, que eu não deveria jogar nada fora. As lembranças de papel eram os marcos pelas estradas por onde passei, de onde juntei terra. Acabei voltando pra produzir mais e mais lembranças até, um dia, poder ficar horas lendo e relendo tudo. De novo, como no primeiro post: não é simples narcisismo, é uma construção pessoal. Sei que todas as pessoas podem fazer o mesmo, todas elas possuem o mesmo conteúdo, só o tratam de maneira diferente.
É hora de voltar pra casa e pegar esses significados antigos, sujos de mofo, e, parafraseando pessoa querida; sujos de tempo. Refazer cálculos, tentar saber como eu talvez seria. Vou precisar disso não para me prender no passado, mas para poder me imolar de uma vez no futuro. Não quero acabar com as indecisões nem inchá-las, quero torná-las digeríveis e tratáveis. Não são ruins. Nada é totalmente ruim.Enfim, porra, como é bom voltar para casa.
terça-feira, 14 de junho de 2011
Conto publicado
Vazio
segunda-feira, 13 de junho de 2011
VI
sexta-feira, 10 de junho de 2011
quinta-feira, 9 de junho de 2011
V
terça-feira, 7 de junho de 2011
III
domingo, 5 de junho de 2011
Empatado
sexta-feira, 28 de janeiro de 2011
A ordem das coisas
Com essas frases pseudo-filosóficas, começo a lembrança das peripécias dos últimos dias. Convém lembrar que isso não tem sentido nenhum. Abri a aba e me deu vontade de escrever. Sorte que quem não vai ler isso. Bueno, por mais que eu quisesse que me devolvessem o passado, acho que ia pegar ele na mão, olhar e devolver. "No, thanks". Certamente ia sentir uma satisfação calhorda em fazer isso, mas é verdade, não troco o hoje por nada e esses devaneios pretéritos se foram, adiós.
Só servem pra me lembrar do caminho até o agora.
Eu tinha um texto escrito assim também, meio no grito das idéias e dos dedos. Xô ver se tá salvo. Ah, tá aqui: (PS: não vou gastar isso aqui, sorry. Já tem destino, CEP e horário).
Me olho no espelho e digo: "you're not more single". Não esperava, não esperava mesmo. Logo de saída, já cometi uma traição. Cigarros que seriam fumados e garrafas que seriam entornadas, me perdoem, mas vocês foram trocados. Não que eu não ame mais vocês, mas as coisas mudaram e vocês sabiam que isso ia acontecer (e não me avisaram). Soltem fumaça e tampas por aí na boca dos outros, não me importo, estão livres. É triste, mas eu sentia um certo entusiasmo por essa lenta decadência que eu ia construindo pra mim. Cedo ou tarde ia largar as coisas que me distanciavam disso e ia me dedicar ao clichè do artista não reconhecido, que eu sempre invejei. Aí que tá o mais bizarro de tudo: eu sinto saudade do que não tive.
Bueno, se há saudade do que não foi, é porque não poderia ter sido. Pequenas atitudes movem o Universo. Depois do meu fracasso, que não é decisivo, veja bem, na tentativa de entrar pra Oficina do Assis Brasil ficou claro que ainda não é momento pra isso. Se houver algum momento pra isso no futuro. Depende de você, diria Sartre. Eu sempre concordei com o careca hilariamente estrábico, mas hoje é difícil acreditar que realmente sou senhor de mim mesmo. Não sou. Sempre quis ter alguém para viver e me preocupar, olha aquele texto antigo lá! Olha che; tu vai dizer que é mentira agora? Hein? Vai dizer? Diga, minta pra si mesmo como eu minto pra mim todos os dias. Minto sim, e chego no fim de cada um desses dias descobrindo com todo o prazer que a mentira era só uma mentira, ajudado pela minha cama vazia. Hoje, com as cobertas meio tristes, a mentira foi um pouco de verdade, mas a verdade é as cobertas não vão ser tristes como já foram.
Chega disso, eu sempre perco o controle dessas coisas. Uma hora vou vomitar tudo mesmo, de verdade e aí eu quero ver o que sobra de mim. Grande medo esse. As mutações estão acontecendo de forma muito veloz comigo. O que ontem era montanhoso e monolítico hoje é uma barra de manteiga no verão. Era inevitável, admita. Por outro lado é bom, só as coisas minhas mais fortes e realmente enraizadas vão ficar, levantando o piso novo com as raízes. Vida. Tenho certeza que ela vai combinar perfeitamente com esses novos azulejos que me deram.
As coisas todas estão aí, esperando que eu dê um significado novo pra elas depois do que me aconteceu. Elas sabem que aconteceu. Ficam me olhando estáticas, esperando uma resposta. E agora meu Deus? Não quero magoar ninguém. Acho melhor ir falando com uma de cada vez. Estudos, desenhos, amigos, trabalho, pais, natureza e todo o resto que era tão sólido dentro de mim, tem toda a razão de se sentir injuriado agora. Eu mudei, então elas também mudaram. E elas não sabem o que fazer se eu não me mexer; elas se movem comigo. Esperem, calma. Uma de cada vez.
sábado, 11 de dezembro de 2010
In Towers
Estou fazendo um diário de campo. Comecei atrasado, cheguei aqui dia 6 de Dezembro e estreiei nas pautas só no dia 9. Tudo bem. A maior parte dele é bastante técnica. Eu queria algo um pouco mais livre, do tipo "visões" da coisa. Isso me lembra aquilo. Isto me dá um insight. Aquilo ali remete algo. Tudo em movimento. Mas não deu ainda, há pouco tempo para escrever no caderno e eu me limito a assuntos técnicos. Tudo bem, ainda vou ter mais tempo na próxima saída de campo em Janeiro.
Um lembrete público, embora ninguém leia isso: apolíneo, dionisíaco e aquilo que une os dois.
segunda-feira, 22 de novembro de 2010
Foto Velha
Sim, nada começa pronto. Tudo se inicia pequeno, mínimo, atômico. Uma fração do que poderá se tornar se você colocar água e der sol, linguiça frita picada e muito daquilo que as mulheres chamam de "carinho" (não que os homens não saibam, mas preferem ignorar isso diante de outros semelhantes).
E as coisas crescem! E, ah meu garoto, aí se encaixam uma série de coisas. Foi o que eu disse no começo não?
Mas nada vem do Nada, pelo menos, a Física prova que não. Pelo menos, eu acho que a Física prova que não. Pelo menos, eu quero acreditar que a Física prova que não. Então, de onde vem aquela coisinha miserável que, quando tu menos percebe, cresce como um monstro do Power Rangers atingido pelo raio aumentador do capanga voador do vilão principal??? E, ah meu garoto, agora só com o Megazord pra derrotar isso você criou.
Sabe, eu não tinha visto nada, nem percebido. Ela passou como um raio. Um raio não, raios matam pessoas e são atraídos por pára-raios, que são coisas pontudas e eretas. Um relâmpago, isso. Aí foi o velho clichê do filme "aquele-lá-que-eu-não-vi-mas-finjo-que-sei". Borrada, de costas, cabelos meio compridos pendurados em cachinhos. Sei lá cara, não vi o rosto dela, nem se usava maquiagem ou se deixava ser usada pela maquiagem. Só sei que parecia bonita, e isso me tocou, fiquei afim da estranha sem nome perdida pelo campus (ou pela parada, praça, bar, sebo, sinaleira, chuveiro, cinzeiro de plástico, pintura do Roerich, conto do Lovecraft, anime qualquer).
Claro, depressão.
Dia quente e eu lá suando no preto, imaginando de onde diabos ela veio, e por que eu sentia aquilo de novo por alguém que eu nunca tinha visto. Pensei o suficiente pra me queimar com o sol na cara e o cigarro nos dedos. Sim porra, eu vou parar de fumar. Mas idéia vai, idéia vem, eu me dei conta de uma coisa: era nada mais, nada menos que A Verdade.
'Conceitue A Verdade' - diria um amigo meu pela milésima sobre o milésimo conceito que eu já expliquei. Mas agora é preciso, chega de subjetivismos. Buenas. A Verdade. Sabe quando tu tá com um problema meio serinho e as vezes aquilo fica te cutucando, enchendo o saco mesmo? Pois é, daí tu pensa, liga os neurônios remanescentes da última batalha, tenta criar relações. Orra, claro que tu faz isso, mas é normal que tu nem nota. Escrito na água.
Bom, então tu faz aquilo que te fez chegar ao que tu é hoje: tu exercita tua razão. Daí acontece uma coisa muito legal. Parece que tu cria uma idéia imbatível, insuperável, que nem todos os teóricos da ontologia e da estética teriam criado. Por um segundo (ou mais dependendo do nível de álcool) tu é Deus. É, é errado pensar isso, ou certo, tanto faz. O fato é que isso já deve ter te acontecido e foi isso que eu tive.
Sempre fui assim, idealista demais, abstrato demais. É uma fuga, lógico, qualquer psicólogo, psicanalista ou psicopata chega na mesma conclusão. É por isso que surtam. É por isso que eu surto. Ok, daí vem a voz daquele cara que sentava no fundão da sala, jogava bola pra caralho, era cercado de mulheres, usava "ûs pâno dûs mânu" e era cercado de mulheres e lambe-bolas da melhor pedigree. 'São hormônios cara, tu precisa por isso pra fora'. Seguem-se explicações obscenas sobre a pior seca que o teu Nordeste já teve.
Certo, tenho alguns anos atrasados em relação a isso, mas não é isso saca? Se fosse, eu já tinha ido resolver isso nos lugares onde se resolve isso. Ou não, por uma série de valores morais. Escolha uma opção e marque um X. O caso é, senhores, que o cavalheiro em foco precisa de alguém, alguém que lhe faça companhia, que lhe esprema cravos, que lhe mande parar de fumar (eu vou parar porra!!!), que faça lhe usar perf... que lhe compre um perfume e que brigue com o cavalheiro sempre que os dias dos meses forem irremediavelmente atingidos e ela seja possuída por uma fúria homicida do qual só ele pode ser o alvo.
A verdade é que eu gostaria disso. Sério cara, rotule do que quiser, eu penso muito nisso as vezes.
Entretanto, contudo, todavia, não obstante, minha futura formação na História me leva a pensar que tem algo mais no menos que isso foi. Tá, sem subjetivismos! Cara, vou tentar ser breve e o menos bucólico possível. Cresci no meio do mato, chutando raiz, correndo de pé descalço e achando o máximo um formigueiro aberto. Tipo Mogli saca? Longe de tudo, longe de todos. Claro tem seus prós e contras, é uma merda total tu ter que usar a Bolívia como ponto de referência pra onde tu mora. Mas eu ainda moro em Porto Alegre, uma capital foda, com mato e urbe dentro das fronteiras.
Mas tá!!! O homem é fruto do meio onde vive né? Porra, quem não leu O Cortiço do Aluísio, por favor. Pelo menos o Rousseau! Enfim che, essa idéia Iluminista se aplica na minha condição, acho eu. Tipo, eu tentei me misturar, fui em danceterias, descobri o álcool e a nicotina, muitas vezes melhores amigos, mas como tu vai refazer aquela tatuagem feia pra cacete que o tatuador chapado de figurinha fez nas tuas costas?
Tu tatua em cima!
Até ficar uma coisa borrada e disforme. Sim, me sinto no meio de uma tatuagem borrada. Não consigo mais ver o Mogli no meio das ruínas de alguma civilização perdida e muito menos o cara boa-pinta velho de trago e rua. Não sou nem um nem outro. Não sei mais quem sou. Preciso de alguém. Não tenho medo do escuro, mas deixa as luzes acesas. Sim, o cara era foda.
Logo, A Verdade que eu tinha criado naquela tarde de sol fudida pra caralho do inverno, que eu achava imbatível pra cacete e já me fazia mandar o Heidegger e o Hegel tomar no cu, virou fumaça que eu soprei devagar do cigarro. Anotei no caderninho "A Verdade é uma Mentira".
Claro, depois mudei de idéia pela saganésima vez, mas os momentos que nós temos essas sensações são terríveis. "Caralho, eu pensei tudo isso e não tirei o pé da merda...
E daí ela já devia estar onde ela deve estar, fazendo o que deve fazer, do jeito que deve fazer. E eu fiquei lá, viajando e suando naquela merda de sol, imaginando um monte de atividades coletivas que não seriam realizadas. Isso tudo vai se somando... esse texto todo é um resultado disso. Estourou. Um pequeno Big Bang. As vezes é mais, as vezes é menos.
As vezes só foi escrito na água. Ou a água refletiu o que eu tinha que escrever.
Preciso sair disso com urgência. Preciso que me soltem!!!
Soltem-me! Soltem-me!
Solto-me?
terça-feira, 9 de novembro de 2010
Lembranças e Música
Dentes Tortos Sempre Estão Errados
sábado, 30 de outubro de 2010
Ah sim, eu nunca começo de onde parei.
sábado, 10 de abril de 2010
Arrepios
Antes de seguir: qualquer semelhança com o romance "O Perfume" do Süskind é mera coincidência, li o livro há cerca de dois anos atrás e fiquei meio apavorado com o excesso de semelhanças, vou ver se ainda falo disso.
Me lembro que organizei e dividi eles quando era bem guri. Pequeno mesmo. Claro, na época eu não conseguia rotular eles de forma devida. Eles não tinham nomes. Eram singulares e próximos uns entre os outros apenas pela quantidade de serotonina que me faziam liberar. Quando resolvi me exilar das coisas, ficando dentro de mim mesmo, revisei os mais importantes, busquei os seus gatilhos, ações que faziam eles funcionar e, deliciosamente, aplicava conforme as ocasiões surgiam.
Os arrepios evoluíam no meu cérebro. Eu procurava proximidades entre eles e existiam ordens de importância. Alguns produziam mais que outros e eu usava esses com bem mais frequência, incrementando e transformando-os em coisas novas, as vezes longe mesmo das esferas dos arrepios. Os velhos e não usados, morriam, incapazes de seres guardados ou transcritos pro papel. Um deles era o "Menina com Pinha" como chamei ele, quando passei eles a limpo. Eu estudava num colégio público na época. Não lembro minha idade, mas foi antes da 6ª série quando troquei de sistema de ensino. Era época de pinhas, pinhão saca? Eles tinham espinhos e a gente ficava tocando uns nos outros, mas elas nao machucavam por causa das roupas grossas de inverno. Claro, as vezes algumas davam no rosto ou algo assim, mas não era grave, ao menos não parecia para nós. Arremessávamos eles até que a ponta dos espinhos desfolhasse e ele ficasse leve e inútil, impedindo qualquer arremesso. Me lembro que estávamos todos brincando assim, organizados em "gangues" e jogando pinhas uns nos outros.
Eu joguei uma pinha totalmente gasta tentando acertar alguém, mas ela voôu débil da minha mão e caiu pra frente, esquecida no meio da fúria guerreira que acometia as crianças. Então uma menina, uma guria que não recordo mais como era, pegou a pinha e ficou olhando pra ela. Ela não me olhou, então não sabia quem tinha jogado, se é que se preocupou em saber. Ficou olhando por uns longuíssimos quinze segundos, interessada a fundo, ate que alguém chamou ela e ela jogou a pinha no chão e correu pra longe dali. Eu tinha olhado ela durante todo esse tempo, sentindo um arrepio tremendo.
Me dei conta disso na hora em que ele terminou, deixando um rastro de pelos eriçados na minha nuca. Não tinha nada a ver com sexo oposto ou uma possível precocidade hormonal. Eu olhava assim pras pessoas procurando arrepios simplesmente porque gostava (e ainda gosto) de sentir os arrepios. Puro deleite pessoal. Fui até lá e peguei a pinha, procurando o que teria sido. O que foi que eu tinha perdido? Eu procurava o gatilho da coisa, o botão que fazia aquilo funcionar, mas a pinha não tinha nada, estava vazia agora. Deserdei do campo de combate atrás da menina, procurei ela por todo o lugar, mas não achei, nem nunca mais acharia. Como um fantasma, ela me deu o arrepio e sumiu.
Esqueci dela, mas a situação prosseguiu, ainda na mesma escola. Eu tinha notas ruins, não conseguia focar atenção na aula, era chato demais. Naturalmente, fui parar no gabinete da sócio-educadora que trabalhava lá. Ela pediu que eu levasse meu caderno de aula. Cheguei lá e senti uma atmosfera diferente, algo novo, que só as crianças conseguem perceber de forma distinta e lhes falta palavras pra descrever como é. Ela me disse que sentasse e comecei a sentir arrepios. Perguntou meu nome e arrepios. Em que ano eu estava e arrepios. Quantos anos tinha e arrepios. A sala e as janelas estavam mudas e a voz dela ecoava na minha cabeça, arrepiando. Ela pegou meu caderno e, começou a folhear as páginas dele, me perguntando coisas. Eu já não conseguia responder com coerência, eu só olhava para a ação, embabascado e arrepiando como nunca antes. Ela falava que minha letra era ruim, que eu tinha que fazer caligrafia e fechou meu caderno de capa azul, encerrando bruscamente meus arrepios. Não lembro de mais nada depois que ela fechou o meu caderno, era como se tudo o que fosse importante na entrevista tivesse acabado no momento que ela me entregou ele. Me lembro da cor oliva das paredes, do céu nublado com neblina na rua, da cara da sócio-educadora, do batom que ela usava! Depois do caderno fechar, nada mais era importante lá. Esse foi o arrepio mais marcante da minha vida, e lembro dele com carinho. Saí de lá extasiado: eu achara o gatilho daquele arrepio tão... completo.
Foram de longe, os melhores arrepios que eu tive, na sala . Me dei conta que as pessoas precisavam observar, manusear algo que eu tinha tocado, que era MEU. Eu também tinha que ficar mudo, quieto demais, concentrado 100% na ação da pessoa, empedrando e virando estátua. Aos poucos eu aprendi a acionar ele, e admito, foi muito divertido! Eu pegava livros da biblioteca e mostrava para as professoras: "Hei, olha esse livro profe!" Ela folheava ele de forma displicente, me deixando louco. Deixava cair coisas minhas no chão, para as pessoas pegarem e examinarem. Esquecia elas em cima da classe, para que me devolvessem...
O realmente interessante disso, é que eu não consigo mais sentir arrepios com a frequência de antes. Por um bom tempo, não fui capaz de sentir arrepios. Os gatilhos aos poucos se tornavam fracos, desgastavam com o uso conforme eu achava coisas pra fazer, isso matava eles um pouco mais porque eu precisava de tempo, lembrando a situação, os botões que faziam eles funcionar. Isso me entregava num furor autista delicioso, me arrepiando só com as lembranças, hoje, não tenho muito tempo para isso. Outra coisa interessante, é que eu conseguia tornar válido um arrepio ou não, analisando ele.
Se eu pensasse: "pinhas idiotas, qual é a graça nelas?", automaticamente, "Menina com Pinha" não funcionava. No começo foi bastante interessante, mas aos poucos eu não conseguia reativar eles de novo, e em breve, só conseguia desativar eles, viciado em pensamento. Eu pensava "se eu pensar, que menina com pinha é ruim, vou cancelar esse arrepio e nunca mais sentir ele de novo", e isso efetivamente acontecia, por mais incrível que possa parecer. Perdi não só arrepios por vício de pensamento, mas já tomei atitudes erradas e tirei conclusões equivocadas por causa disso.
Hoje eu só sinto os arrepios antigos de forma muito, muito gasta. Descobri um novo, que acontece quando estou ouvindo música, mas não vou escrever ele porque posso acidentalmente criar um vício de pensamento. E sim, é imbecil, mas não quero mais perder arrepios. Quando tudo estiver errado eu vou só sentir arrepios e vou ficar bem.
Ultimamente, tenho me esforçado num pequeno projeto subliminar: a pesquisa de arrepios. Eu relembro eles até a exaustão, tentando sentir alguma coisa, incentivando com condições que me façam sentir arrepios naturais. Como o frio. Antes de dormir, me tapo bastante e ligo o ventilador. Me concentro, reviro o acervo da memória e me exponho um pouco ao vento. O arrepio do vento me ajuda a encontrar os arrepios no arquivo. Por essas e outras coisas, as vezes eu mesmo me considero louco, doente, mas me sinto muito, muito bem, e não consigo me imaginar de forma diferente.
Aos poucos consegui encontrar alguns arrepios, mas no combate com as outras obrigações, perco eles de novo, eles fogem de mim. Acho que estou ficando velho pra arrepios, mas vou achar alguma tática que conecte as coisas, lá dentro. Uma delas, foi esta. Escrever isso, me lembrar da escola, foi muito bom. Tive muitos arrepios.
domingo, 4 de abril de 2010
I
Crio este lugar com fins terapêuticos. Sou doente por mim mesmo, mas por mais paradoxal que isso possa parecer, isso está mais longe do que nunca do narcisismo. Preciso escrever o que passa, por onde passa e quando passa, pra que eu possa tentar descobrir PORQUE passa. E a única dica que eu tenho, sou eu. E eu acredito que as pessoas são filtros, sujos, de café ou bagaço de fruta. Pegamos a verdade e lemos, coamos através dos medos, crenças e culturas. Sai algo novo e bom, doce se tiver açúcar, mas muito longe dos pés de café, das laranjeiras, das fazendas.
Eu quero a fruta, sentir o cheiro dela, pegar nas folhas e esmagar elas na palma da mão. Mas nada é de graça. Faço isso pra me entender, ou ficar mais doente ainda, nada mais.
Muito vou dizer "eu" e "outros". Vou dar pulos de lá pra cá, dentro de mim, dentro da idéia das coisas, sem paradas programadas e sem guias. Não quero que me entendam. Pff, nem eu sei sobre isso! Quero que... Fiquem aí mesmo, do jeito sempre foram, porque eu sei que vocês que estão longe não vão mudar, os próximos mudarão pouco. Comparado a mim, que prevejo catástrofes subjetivas.
Tenho um terrível senso de regularidade criativa. Os recortes do mundo aparecem todos de uma só vez, dadaístas. Primeiro vou tentar catalogar eles aqui e em um caderno pessoal (minha enésima tentativa), sem exatamente uma ordem de importância, e o blog vai ser o resultado final. Posso parar de escrever do nada, mas isso não seria nenhuma novidade. A idéia é: as coisas mudam, por ora pouco ou muito de cada vez, e agora mudam rápido demais. Seja o que for que acontecer aqui, nesse lugar virtual, aconteceu comigo. Ou escrevi ou parei pra sempre-até-a-próxima-vez.
Um dos grandes incentivos pra começar aqui foi o desperdício. Digamos que sou um frequentador constante do transporte coletivo da cidade de Porto Alegre. Moro a meio termo do urbano e do rural (a microrregião é considerada "rurbana", no joking) e pego ônibus pra caralho. Pelos meus cálculos, nas viagens do dia-a-dia perco três horas em bus. Ainda não sei por que, e já me perguntei demais, mas é exatamente nos coletivos que isso aflora de forma mais violenta. Músicas, frases, versos, explicações sobre absolutamente qualquer coisa. Sinto meus ossos racharem, de cansaço, do dia cheio de serviço e aula, das músicas no MP4... E derivo.
Mas fica por isso mesmo. Só vomito, chego em casa, tomo um banho e estou limpo. Amanhã será um novo dia, igual a esse, mas novo, e é visível a diferença entre uma embalagem nova e uma velha. As vezes algo ainda fica ali, renitente demais. Ignoro na maior parte das vezes. Há alguns dias cheguei à conclusão de que isso era errado. Hoje parece sacrilégio. Mas quem sabe amanhã, todas essas linhas fiquem sem continuidade. Sem sentido. E eu ache outra coisa pra fazer, ou nada.
Vou curar isso. Espero que esse tratamento, esses pequenos curativos de agora, que o médico os leve em consideração. Que depois se atreva a passar uma sutura nesse lugar de onde brotam coisas. Talvez um dia, quem sabe, ele até costure a moleira com a qual eu nasci. Mas desconfio desse cara. Esse cara sou eu.